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NÃO SABIA NADA DE BUSINESS ENQUANTO CURSAVA ENGENHARIA DE PRODUÇÃO

Entrevista com Silvana Machado, consultora da Egon Zehnder e ex-partner da AT Kearney.

Silvana Machado, atual consultora da Egon Zehnder – consultoria voltada para executive search e gestão de talentos -, foi partner na A.T. Kearney entre 2008 e 2016 e superintendente executiva do Santander até 2008. Em julho, os consultores da Insper Jr. Consulting tiveram uma conversa com ela sobre as dificuldades iniciais de ser engenheira na área de consultoria e o que é preciso ter para se dar melhor no mercado.

Você é formada em Engenharia, o que te levou a ir pra consultoria logo como primeiro caminho/emprego? Quais foram os fatores que você levou em conta para decidir isso?

SM: Na verdade, eu achava que iria para a Indústria, inclusive estava estagiando na parte de planejamento e controle de produção na Dinap, distribuidora do grupo Abril. Entretanto, tive uma aula na faculdade sobre gestão de projetos realizada pela McKinsey, onde eles fizeram uma propaganda sobre o que é uma consultoria estratégica e como funcionava o dia a dia de um consultor, como é a exposição a várias indústrias, viagens, diversos clientes, diferentes projetos, possibilidade de se fazer um MBA e achei aquilo um máximo. A partir disso, fui pesquisar e achei a McKinsey e a Booz Allen, entre outras consultorias. Então, me perguntei por que ficar em uma empresa fixa, quando em uma consultoria estaria sendo exposta a diversas experiências diferentes. Portanto, devido ao meu grande interesse, prestei os processos seletivos das empresas normais, mas também fiz os processos da Booz Allen e Mckinsey.

Você ficou bastante tempo na Booz Allen, quais foram os principais desafios inicialmente e quais aprendizados você teve durante esta experiência?

SM: Mesmo não tendo nenhuma experiência em business na faculdade, a Booz já recrutava engenheiros. Dessa forma, o aprendizado mais de business aconteceu mesmo quando entrei na Booz Allen. Não sabia nada de negócios enquanto cursava Engenharia de Produção, não tinha matérias relacionadas a isso, uma ou outra, como contabilidade e finanças em uma matéria só e uma aula de economia. Hoje em dia, a Engenharia de Produção já possui bem mais matérias relacionadas a esses tópicos de business. Então, visto que a Booz possuía alguns treinamentos, fiz os treinamentos da empresa e, também aprendi meio on-the-job, na minha época se trabalhava cem horas por semana, então se aprendia de qualquer jeito, com outros consultores e no dia-a-dia.

Quais foram as dificuldades de ser Partner de uma consultoria? Como foi essa experiência para você, visto que durou bastante tempo?

SM: Então, tem várias coisas, as pessoas de consultoria são bem exigentes / críticas, gerir pessoas críticas é bem difícil.  Diversos fatores importam, como: “o projeto é legal? O desenvolvimento que elas estão tendo é o que elas esperam? A velocidade da carreira é o que espero? A equipe é legal? Etc.”

Quando eu voltei para a A.T. Kearney em 2008, o estilo de liderança era mais autoritário, algo que não se encaixava com o estilo mais colaborativo da consultoria, então, em um determinado momento, meus sócios pediram que eu assumisse como Head do escritório no Brasil.

Pensei que precisava que mudar, pois não era meu estilo e nem o da empresa. A equipe (os Principals e Managers) achavam que estavam infantilizados) e a empresa ainda não era do tamanho de um grande competidor no Brasil – ali éramos 6 sócios e 10 principals, então, eu falava “ somos 16 seniors, porque assim somos 16 contra 20 ou 30 de uma Mcksinsey ou Bain e isso faria com que ficássemos em patamares iguais. Logo, eu criei a reunião  de liderança semanal com 16 sócios e principals. Eles ainda não tinham o título de sócios, mas eu falava “a liderança é representada por nós aqui”, as decisões eram tomadas em conjunto e atuávamos como um time.

Eu abria sempre as informações do escritório, os KPIs e toda sexta-feira enviava o Pipeline de negócios. Foi um período bem legal, os sócios se uniram muito nesse período. Foram 5 anos até vir para cá (Egon Zehnder), e durante esse período a gente não perdeu praticamente ninguém para concorrência, apenas um ou outro consultor que saiu para um cliente. Nesse período, a Kearney foi quase dobrou em número de pessoas no escritório brasileiro.

Trabalhamos muito a gestão, desenvolvimento e cuidado com as pessoas nesta época. Tem uma coisa em consultor: eles sempre são overachievers, então a pessoa pensa “não fui promovido naquele período” e fica insatisfeito e inseguro, então você tinha que dar feedback e brasileiro não é bom de dar feedback né? Então eu incentivava que tinha de dar um feedback correto e  acompanhava a pessoa. Foi uma experiência boa, bem boa.

Algo interessante em sua carreira é que você realizou a mudança para o mercado financeiro, onde você passou cerca de 5 anos, por dois bancos diferentes. Foi visto que você participou bastante da área de varejo/retail management. Você conseguiu levar aprendizados dos anos de consultoria para essa nova fase de sua carreira?

SM: Nunca achei que iria sair de consultoria, porém o Banco ABN Real já tinha me chamado algumas vezes devido ao grande número de projetos que já havíamos feito com eles na época da Booz Allen, então já conhecia todo mundo e já era bastante natural. Eles sempre me chamavam e achava que não era hora de ir, estava indecisa. Porém, estava na A.T. Kearney e não estava mais realizando projetos com eles, mas o contato nunca parou. Já era principal da AT Kearney há dois anos e em um ano seria partner da consultoria, ai um dia, não sei o que aconteceu e pensei que já ia chegar muito rápido ao topo da carreira e me deu um grande interesse em conhecer e experimentar o mercado financeiro como executiva. Nisso, um dos meus colegas do banco me ligou me convidando para ir para trabalhar lá, e pensei, “estava com 32 anos na época e não precisava virar sócia naquele momento, então me perguntei se não iria experimentar mais nada”. Então, teve o convite para uma área que muitos consultores vão que é a área de estratégia do banco, sendo uma transição super boa para um consultor, fácil de adaptar. Na época, muitas pessoas fizeram esse “move”, então o banco me convidou e eu fui, teve até uma festa da A.T. Kearney de despedida para mim que foi muito legal. Foi uma experiência muito rica, porque conhecia todo mundo, fui para uma área legal, gostava muito do varejo financeiro e de gerenciar os projetos estratégicos do Banco.

Assim que entrei, tive que montar uma equipe, chamei gente de vários lugares e fiquei dois anos nesta posição. Além disso, após uma reestruturação no Banco e várias entregas de sucesso, assumi uma posição para liderar um P&L (lucros e perdas , em tradução livre) onde geria os segmentos de alta, média e baixa renda. Depois disso, o Santander começou a conversar comigo sobre uma oportunidade lá, de criar uma área de gestão de segmentos do início. Depois de 4 meses da minha chegada, o Banco ABN Real foi vendido ao Santander e então a perspectiva mudou de criação de algo do zero para integrar a operação antiga da qual eu havia participado. Aprendi muito no Santander em uma cultura completamente diferente, um banco mais agressivo comercialmente. Após 1 ano mais ou menos, a A.T. Kearney me convidou para voltar como Partner para liderar a Prática de Serviços Financeiros e neste momento bateu a saudade de consultoria.

Aprendi muito sendo executiva e gostei da experiência. Mesmo tendo já ouvido alguns consultores dizendo que não gostaram da experiência de executivo, principalmente por causa da rotina, este não foi meu caso. Acredito que tudo tem vantagens e desvantagens, e você tem que saber tirar o melhor de cada situação, por exemplo como executiva, dá para ter bastante entrega e impacto. Em um banco grande, tem gente com ambições diferentes então com isso você aprende muito, logo você desenvolve outras habilidades. Além disso, achava que voltando para consultoria eu poderia ser uma consultora melhor e servir meus clientes de forma diferenciada, pois sabia como o executivo pensava e também conhecia coisas que poderiam ser utilizadas para melhorar a gestão na A.T. Kearney.

Você auxilia várias empresas para o recrutamento de renomadas áreas do mercado financeiro como: PE (Private Equity), Wealth Management, IB (Investment Banking), Asset, e além disso você tem obviamente uma vasta experiência em Consultoria. Quais, na sua opinião, são as características necessárias aos jovens querendo ingressar nesses ramos/áreas?

SM: Eu acho que hoje é muito importante ter drive, foco e resiliência, para perseguir objetivos e superar obstáculos e, se você cair, você deve levantar e continuar cuidando do seu equilíbrio emocional. Importante ter habilidade analítica para estar nessas posições, olhar números, KPIs, resultados, mas também ter inteligência emocional é essencial, saber lidar bem com outras pessoas, trabalhar em equipe, ser colaborativo. O “eu mando e o outro obedece” acabou, hoje tudo é feito na colaboração e quanto mais você conseguir que as pessoas façam algo por acreditarem naquilo e estarem engajadas, melhor será o resultado Outra coisa que é necessário, é ser flexível. Com o mundo em constante mudança, é fundamental a capacidade de adaptação – você sempre precisa estar aberto para o novo.

O profissional mais bem-sucedido é alguém que tem equilíbrio entre a visão estratégica e a capacidade de execução de fato, ser hands-on (mão na massa). É preciso ter “iniciativa e acabativa”, ou seja, ter ideias e implementá-las. Na gestão de pessoas, é preciso inspirar, dar uma visão de onde se quer chegar, e dar feedback duro e sincero quando tem que dar. Os melhores profissionais que eu vi na vida eram aqueles bem equilibrados em termos de competências e habilidades, que tinham um pouco de cada, os extremos não funcionam. Lógico que as pessoas têm “spikes”, mas não é possível ser bom apenas em um skill, você tem que ter um pouco de tudo.

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